Uma remota cidade brasileira superando o isolamento por meio de um festival

Não há pontes ou estradas ligando a cidade insular de Parintins ao resto do mundo. Esta cidade remota na Amazônia fica a 369 quilômetros de Manaus, capital do estado brasileiro do Amazonas. Parintins abriga milhares de indígenas e brasileiros de baixa renda e só pode ser alcançada de avião ou barco. Sua posição ao longo do rio Amazonas a torna dependente de produtos básicos e recursos que chegam de cidades distantes.

Apesar dessas condições isoladas, a comunidade de Parintins desenvolveu uma nova estratégia que celebra suas tradições populares e indígenas: a Festival do Boi-Bumba. Este evento anual é o segundo festival mais importante do Brasil, depois do mundialmente famoso carnaval do Rio de Janeiro.

Boi-Bumba, que acontece no final de junho, dinamiza a economia local ao atrair investimentos e milhares de visitantes e artistas. Ao longo dos anos, o festival tornou-se a ponte da cidade da Amazônia profunda para o mundo exterior, reduzindo o isolamento político e físico e reforçando seu capital social e bens culturais.

Uma vista aérea de um bairro da cidade.  No centro há um grande lugar com assentos vermelhos e azuis.
Festival de carros alegóricos do lado de fora do Bumbódromo de Parintins.
Fornecido pelo autor (sem reutilização)

Desafios logísticos, políticos e organizacionais

Boi-Bumba tem uma peculiaridade: uma competição entre duas equipes tradicionais, garantido (em vermelho) e Caprichoso (Em azul). As equipes competem durante três noites de apresentações artísticas no Bumbódromo — uma arena de trinta e cinco mil lugares construída especificamente para o festival. O festival transforma a cidade em uma festa colorida, barulhenta e vibrante.

Durante o festival, a população da cidade quase dobra, criando desafios logísticos significativos que vão desde o abastecimento de água até o transporte. Milhares de visitantes chegam de barco e avião de Manaus e de outros lugares. Mas a rede hoteleira em Parintins tem capacidade limitada. Turistas e vendedores ambulantes de várias classes sociais se misturam, dormindo em redes, barcos e casas de aldeia que são temporariamente transformadas em abrigos.

Um homem ao lado de uma grande escultura de um cavalo pintando o olho do cavalo.
Artistas criando esculturas para o festival.
Autor fornecido

A maquinaria organizativa de apoio ao evento começa meses antes do festival. Um exército de artistas, escultores, soldadores, pintores e alfaiates trabalham dia e noite dentro galpões (grandes hangares) para criar carros alegóricos de até 25 metros de altura e confeccionar as fantasias que os dançarinos, acrobatas, cantores e músicos usarão durante os shows.

Para trabalhadores pouco qualificados, na maioria das vezes empresários informais mal pagos, o festival continua a ser uma forma indispensável de apoio financeiro. Para todos na cidade, fazer parte do festival é uma questão de identidade e pertencimento.

Um grupo de pessoas vestidas com camisetas vermelhas se reúne em torno de uma fogueira e uma vaca falsa com chifres.
garantido (o time vermelho) sai às ruas para dançar ao redor das fogueiras na noite de 12 de junho, véspera de San Antonio.
Autor fornecido

superando a pandemia

A região foi uma das mais atingidas pela pandemia de COVID-19. Parintins introduziu um toque de recolher que limitou as oportunidades de trabalho, especialmente para trabalhadores informais. Restrições pandêmicas significaram que as festividades foram suspensas por dois anos.. Durante esse tempo, a pobreza, o desemprego, o crime e outras vulnerabilidades pioraram.

Mas o bumbás (ambas as equipes) forneceram a infraestrutura e a rede para as pessoas obterem a ajuda de que precisavam. As instalações do festival tornaram-se centros de ajuda para os mais vulneráveis. Membros da equipe distribuiu centenas de cestas básicas S prestou apoio durante a campanha de vacinação.

As pessoas pintam um mural na parede.
Artistas saem às ruas de Parintins para comemorar a volta do festival.
Mauro Cosu

Graças aos esforços dos organizadores, o festival ainda pôde continuar virtualmente. A edição de 2020 foi realizada sem espectadores ao vivo e foi transmitida pela televisão brasileira. Algo semelhante aconteceu no ano seguinte: a Jogos ao vivo 2021 foi seguido por uma grande audiência na televisão e por mais de 20.000 pessoas ao vivo no YouTube. Segundo Jender Lobato, presidente da Caprichoso, também gerou aproximadamente 10.000 tweets e alcançou mais de três milhões de pessoas nas redes sociais.

Com fãs e entusiastas assistindo ao evento online, comprando souvenirs e fazendo doações, o Boi-Bumba encontrou novas formas de existir, contribuindo para a sustentabilidade socioeconômica da comunidade e mantendo Parintins no mapa político do Brasil.

O retorno do Boi-Bumba

No início de março de 2022, o governador do estado do Amazonas, Wilson Lima, anunciou o retorno do festival. Tanto o governo quanto os investidores privados aumentaram seu compromisso de criar uma “histórica 55ª edição”.

Um grande mural vermelho e azul na lateral de um prédio cinza com um papagaio dançando e uma vaca com chifres.
Artistas de rua pintando um grande mural na fachada do estádio.
Fornecido pelo autor (sem reutilização)

As ruas foram pavimentadas, o museu da cidade foi reformado, a arte de rua apareceu nas muralhas da cidade e o Bumbódromo ele recebeu um facelift. O festival de Parintins tornou-se um modelo para outras cidades e vilas seguirem. Uma pesquisa recente mostra a existência de mais de 120 bois-bumbás em 23 cidades amazônicas.

Confiar na tradição e nos esforços culturais provou ser uma maneira bem-sucedida de superar o isolamento. a Boi-Bumba não resolve todos os desafios de Parintins e da região amazônica. Mas traz enormes benefícios em um território caracterizado pela marginalização, exclusão e falta crônica de infraestrutura. É em torno da festa que Parintins e seus moradores podem celebrar suas tradições enquanto constroem uma visão compartilhada de seu próprio futuro.

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