Segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar, de março a julho, o setor representou queda de 327 mil usuários
A nova pandemia do coronavírus atingiu famílias, redes de saúde, empregos e, claro, quem tinha plano de saúde como garantia extra de atendimento em meio à crise de saúde.
De março a julho, o setor registrou queda de 327 mil usuários. Os dados são da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), que regula o mercado. Para os especialistas, a situação está ligada ao aumento do desemprego e à perda de renda da população.
Atualmente, o país conta com 46.758.762 usuários de planos de saúde, o que representa 22% dos brasileiros. Para efeito de comparação, em março, esse número era 47.085.717. Embora as variações sejam frequentes, não houve redução desse patamar em um curto período desde janeiro de 2017.
Segundo dados da ANS, a queda foi maior nos meses de abril e maio, apenas neste último houve 226 mil usuários a menos. Em seguida, houve nova queda em junho, ainda que em ritmo menor, e leve alta em julho, insuficiente para recuperar a perda.
Para o IESS (Instituto de Estudos de Saúde Suplementar), a variação ocorrida em julho indica uma possível estabilidade. O grupo, porém, alerta que ainda é cedo para fazer uma análise definitiva.
Entre os motivos está a incerteza da epidemia, com o risco de “novas vagas” da Covid-19 e uma reversão da retomada das atividades, além de um possível efeito tardio das demissões (parte dos demitidos mantém o plano durante uns meses).
“Se considerarmos que 1,2 milhão de pessoas foram dispensadas, esse impacto pode ser ainda maior”, diz Marcos Novais, superintendente da Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde).
Para Mário Scheffer, professor da Faculdade de Medicina da USP, a queda no número de usuários de planos de saúde já era esperada. “Em outros momentos históricos, essa retração ocorreu. É acentuada, mas os planos têm esse perfil: sempre que houver desemprego e recessão econômica, que são dois efeitos adversos da pandemia, há queda de clientes”.
Segundo a ANS, os planos coletivos vinculados às empresas puxaram a queda: foram, no total, 311 mil usuários a menos nessa categoria desde março.
A perda de receita, no entanto, também pode ter se refletido em planos individuais ou familiares, contratados pelo próprio usuário, cuja queda foi de 49,3 mil clientes.
Pelo contrário, os planos coletivos de adesão, representando associações e sindicatos de categoria, aumentaram em 35,3 mil usuários desde março. Em geral, são mais baratos do que os preços individuais, embora estejam sujeitos a ajustes maiores.
Ana Carolina Navarrete, coordenadora de saúde do Idec (Instituto de Direito do Consumidor), aponta dois culpados pela queda: as próprias operadoras e uma omissão da ANS. “Enviamos uma carta no início da pandemia dizendo que precisaríamos de medidas para mitigar a saída do mercado, o que a agência não tomou”.
Entre essas medidas, diz ele, estão a ampliação dos prazos de carência para o descumprimento, rejeitada pela maioria das operadoras, e a suspensão dos reajustes mensais, que só foi apurada agora, em agosto, com validade para setembro e dezembro.
No entanto, a medida deixou de lado planos comerciais com mais de 30 usuários. Com a demora, alguns usuários também passaram por ajustes desde março.
Foi o caso de José Napolitano, de 77 anos, que teve reajuste mensal há três meses. “Minha mensalidade era de R $ 3,5 mil e consegui reduzir para R $ 2,5 mil na Justiça. Mas foi uma alegria que não durou, porque teve um aumento de 16% e hoje pago quase R $ 3 mil”, diz.
O valor, diz ele, ficou ainda maior em tempos de pandemia. Aposentado, exerceu atividades adicionais como corretor de imóveis para complementar sua renda. Mas, estando no grupo de risco de coronavírus, parou.
Para a advogada Renata Vilhena Silva, especializada no direito à saúde, a suspensão aplicada pela ANS – que agora também se aplica a parte dos já reajustados, sem recuperar os valores já pagos – representa apenas um tranco temporário, pois há risco de um aumento ainda maior. em 2021.
“O pior é que o usuário terá que pagar mais no futuro”, diz Navarrete, do Idec, para quem o cenário pode fazer com que o usuário desista do plano.
A queda de usuários e as diferenças por reajustes, porém, não foram a única marca da pandemia Covid-19 no setor, que teve uma queda histórica no atendimento, o que ajudou a reduzir custos, diz Navarrete, para quem este permitiria a regulamentação. o melhor dos reajustes.
“Dizer que as despesas não aumentaram tanto no período pandêmico em um ponto é correto. Mas o que vem amanhã e de agora em diante? ”, Afirma José Cechin, superintendente do IESS.
Em nota, Vera Valente, diretora executiva da FenaSaúde, que representa as principais operadoras, afirma que considera “inadequado analisar a questão dos reajustes mensais de tarifas numa perspetiva de curto prazo”. Para ela, suspender os reajustes pode deixar os planos desequilibrados, o que afetaria principalmente as pequenas operadoras.
Questionado sobre a queda de usuários, Valente garante que uma conclusão seria “precipitada, prematura e incompleta”. “A verdade é que os beneficiários que perdem a cobertura tendem a buscar atendimento no SUS, o que onera ainda mais os recursos públicos”.
Ele defende a retomada da discussão sobre a possibilidade de planos mais baratos e segmentados para “enfrentar a crise, a recessão, a perda de renda e o aumento da informalidade no mercado de trabalho”.
Para Scheffer, o argumento é falacioso. “Quais perdem primeiro? Provavelmente as das empresas mais frágeis, que também têm planos menores.”
Procurada pelo relatório, a ANS afirmou que vem monitorando os impactos da pandemia e tem feito esforços para implementar medidas capazes de “preservar tanto a assistência ao usuário quanto a sustentabilidade e equilíbrio do mercado”.
Sobre as críticas à demora, ele afirma que age com rapidez, “mas é fundamental respeitar o tempo necessário para as avaliações”. Diz ainda que, desde o início da pandemia, tem sido incentivada a negociação e flexibilidade para o pagamento das mensalidades.