O compositor Orlando Haddad, conhecido principalmente pelo jazz brasileiro original que executa com sua parceira musical e de vida Patricia King Haddad em sua dupla Minas, tem uma nova obra clássica para ensemble de câmara. Encomendado pela Orquestra 2001, e inspirado no folclore sobre a floresta amazônica, Lendas da Amazônia integra elementos da música brasileira e do cânone clássico ocidental.
* Você pode ouvir este trabalho na íntegra no final deste post.
Abre-se o som de um berimbau, instrumento nativo da África, hoje muito utilizado na música brasileira. Amazon Legends. “É um instrumento de uma corda com uma cabaça que o músico segura contra a barriga”, diz o compositor Orlando Haddad. “Ele acerta aquela corda e com a mão coloca uma moeda ou um pedaço de pedra na corda. Ele só tem dois lançamentos, mas é muito rico. Você tem uma cesta que segura na mão. E quando você acerta, o a cesta balança e faz barulho ”.
Crédito Santiago Urquijo / Getty Images
Orlando cresceu no Brasil, onde estudou música clássica antes de vir para os Estados Unidos para estudar na University of North Carolina. Lá conheceu Patricia, com quem fundou a dupla brasileira de jazz Minas. Além do trabalho mineiro, escreveu clássicos, como dois ciclos de canções, uma peça de câmara e uma lição de casa 12 tons para oboé e viola.
Lendas da Amazônia começou com canções de violão que Orlando havia iniciado após experimentar a grandiosidade exuberante da Amazônia durante uma viagem em família ao seu Brasil natal. As canções estavam inacabadas, em seu ‘banho-maria’ até Orquestra 2001 encomendou um novo trabalho para seu programa sobre compositores brasileiros como parte de Série VOCES do Esperanza Arts Center.
“Achei que essa seria uma boa forma de desenvolver essas peças e reorquestrar o violão para um grupo de música de câmara”, diz Orlando, que já compôs Lendas da Amazônia para flauta, oboé, sax alto, sax tenor, contrabaixo, piano, violão e percussão.
A peça de cinco movimentos traz vida musical a sete histórias coloridas do mundo mitológico de deuses e humanos, amor e travessura e a importância vital de nossos recursos naturais.
Em maio, Orlando se encontrou comigo na Zoom para discutir sua abordagem para o trabalho.
Aqui estão alguns trechos editados de nossa conversa:
Esta peça é inspirada em certas tradições da música brasileira?
Sim, a música popular do Brasil. Eu uso muitas formas do Brasil – um samba, bossa nova – e eu uso um baião, que é uma forma de dança. Usei muitos instrumentos como o berimbau e a cuica. A cuica emite um som estridente, como o de macacos. Também é africano, mas foi desenvolvido no Brasil e é usado no samba.
Você poderia dar alguns exemplos de como diferentes instrumentos ajudam a contar a história?
A primeira é a história de Jaci, que é o Deus da Lua, e como o Rio Amazonas foi formado. Jaci estava apaixonada por Guaraci, o deus do sol, mas a união deles não foi possível porque o calor do sol derreteria a terra e os gritos da lua inundariam a terra. Jaci estava com o coração partido e chorava dia e noite. As lágrimas de Jaci criaram o rio Amazonas. Então, chamei essa lenda de “Lamento de Jaci” e atribuí-a à flauta. Achei que a flauta teria uma voz que ouviríamos sozinhos na floresta.
No quarto movimento, usei o violão para expressar a alegria do personagem Curupira. Ele é um anão verde e seus pés estão de cabeça para baixo. Deixe pegadas, mas você acha que as pegadas vão em uma direção quando vão em outra direção. E assobia nos ouvidos das pessoas, se não estiverem agindo bem na floresta; se cortam árvores ou maltratam os animais. Isso os engana, os perde e os confunde.
Nesse movimento, criei o tema com um violão, mas depois inverti o tema do final para o início e o atribuí ao oboé.
E então o último movimento se refere a JS Bach.
Sim, Heitor Villa-Lobos escreveu a série, Bachianas brasileiras. Ele costumava imitar Bach, contando com ele à sua maneira. E outros compositores brasileiros também o fizeram.
Então eu escrevi este último movimento sobre uma jovem indiana chamada Naia, que estava apaixonada pelo deus da lua Jaci. Naia persegue a lua, mas nunca foi capaz de alcançá-la, porque a lua estava muito longe. Exausta, ela adormece. Quando ele acorda, ele vê a lua refletida no lago e tragicamente salta e se afoga. O Deus da lua, sentindo compaixão, a transforma nesta linda flor de nenúfar, que só desabrocha à noite.
Escrevi quase como um desfile com o tema que se repete. Tentei gerar tensão ali para expressar minha obsessão pela lua. Então escrevi uma fuga para expressá-lo correndo pela floresta e adormecendo.
Quais são os desafios quando você trabalha com tantos estilos diferentes de música?
Bem, isso me dá um pouco mais de trabalho, porque posso aproveitar muitas coisas. Por exemplo, na banda mineira eu não trago muito a minha bagagem clássica, porque não combina com o estilo, mas aqui não me senti muito constrangida. Sempre gosto de começar de um lugar orgânico, algo que vem de dentro; então eu manipulo os problemas. Eu mudo eles, retrógrado, eu os desvio. Eu os coloco em outra chave e brinco com eles. Não posso usar muita dissonância no meu jazz brasileiro; ao passo que, ao escrever música clássica, posso usar muito mais dissonância ao escrever atonalmente.
Ao colocar música nessas lendas, você esperava que uma mensagem em particular fosse transmitida? Uma mensagem seria sobre a importância de preservar a floresta; outra seria sobre a proteção desses povos indígenas. Essas histórias foram transmitidas de geração em geração por milhares de anos.
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Crédito Nina Siniakova (pianista da obra; não retratada)
A Orquestra 2001 realizou a estreia de Lendas da Amazônia (gravado no World Cafe Live), como parte de seu programa em Música dos séculos 20 e 21 de compositores brasileiros. Foi transmitido de Teatro Esperanza Quarta-feira, 23 de junho. Também no programa estão Sexteto Misitco por Heitor Villa-Lobos, e O livro de feitiçosde Clarice Vasconcelos Assad.
Aqui está um vídeo do show Conexões – Voces Winter Spring 2021, que apresenta Lendas da Amazônia às 25:21.