O Brasil ainda não tem um técnico estrangeiro, mas se há alguém capaz de quebrar essa tendência é Carlo Ancelotti, o brilhante minimalista da Liga dos Campeões, escreve MARTIN SAMUEL.
A narrativa padrão em momentos como este é de aluno e professor. Frank Lampard, relativamente novato, superado pela sabedoria e experiência de Carlo Ancelotti. Jurgen Klopp não é nenhum caipira, porém, ficando em um distante segundo lugar atrás do Real Madrid de Ancelotti na rodada anterior.
Se esta é a última temporada de Ancelotti na Espanha, como muitos acreditam, é fortemente sugerido que seu próximo destino seja o Brasil. Não na praia, não como gerente de clube. Ancelotti está programado para ser o primeiro técnico estrangeiro em tempo integral da seleção brasileira. Não haveria honra maior, nem confirmação mais apropriada de seu talento.
O Brasil não tem dirigentes estrangeiros, não mesmo. No Campeonato Sul-Americano de 1925, Ramón Platero, um uruguaio, co-treinou a equipe com Joaquim Guimarães, natural do Brasil. Sua gestão durou enquanto durou o torneio, que a Argentina venceu. Joreca, que era português, foi outro co-diretor, junto com Flávio Costa, de dois amistosos contra o Uruguai entre 14 e 17 de maio de 1944.
Costa então continuou no papel solo. Por fim, Filpo Núñez, argentino que então comandou o Palmeiras, levou o Brasil a um único amistoso contra o Uruguai em 1965. Ele continua sendo o único técnico estrangeiro a ter total controle de uma partida envolvendo a Seleção.
O fato de o Brasil ter escolhido o técnico sub-20, Ramón Menezes, como técnico interino enquanto espera que Ancelotti decida seu futuro no Real é uma prova do status do italiano.
Ancelotti disse que não entrará em nenhuma discussão até que esta rodada da Liga dos Campeões termine, então a vitória de 2 x 0 de quarta-feira contra o Chelsea foi recebida com grande decepção no Brasil.
O desempenho, no entanto, não terá sido. Ancelotti mostrou, mais uma vez, que é um minimalista brilhante e perspicaz. Ele não faz grandes mudanças dramáticas, mas o que ele faz é inteligente e muitas vezes devastadoramente eficaz. Ele também mostrou que tem uma compreensão inata de dois jovens jogadores brasileiros e como eles devem ser usados.
Nós realmente gostamos de Reece James e Ben Chilwell por aqui. O Chelsea teve seus problemas, mas a maioria concorda que sua dupla de laterais é tão forte quanto qualquer outra no país, e a ausência da dupla devido a uma lesão foi a chave para o péssimo começo sob o comando de Graham Potter.
James pode não ter o alcance de passe de Trent Alexander-Arnold, mas é considerado um defensor superior. Chilwell pode não ser tão agressivo quanto Andrew Robertson, mas muitas vezes pode ser o jogador mais criativo do Chelsea. O casal do Chelsea deixou o Madrid em ruínas nesta quarta-feira.
Chilwell foi expulso, acertando após outro erro do infeliz Marc Cucurella; James viveu uma das noites menos agradáveis de sua carreira profissional.
Seus algozes eram Vinicius Junior e Rodrygo, dois brasileiros de 22 anos que o Chelsea não conseguia controlar. Vinícius foi titular em todas as partidas do Brasil na Copa do Mundo. Rodrygo não, que entrou quatro vezes como reserva, duas vezes para o companheiro de Real. Estiveram juntos em campo por um tempo contra a Suíça e nove minutos contra a Coreia do Sul, com o jogo já vencido. A forma como Ancelotti os usou contra o Chelsea definiu o jogo.
Largura, essa era a chave. Parece tão simples que as pontas permanecem abertas, mas poucos têm confiança para fazê-lo. Ancelotti faz isso. “Com alas como Vinicius e Kylian Mbappé, uma vez que você ganha a bola se não buscar o passe vertical, você é um criminoso”, disse ele ao analisar times durante a Copa do Mundo de 2022. “Não tenho vergonha de ficar atrás e procurar o contra-ataque, embora eu tenha jogadores de qualidade”.
Foi o que ele fez contra o Chelsea. O time da Premier League teve muita posse de bola, mas em áreas que pouco importavam. La Real pressionou alto, mas seu melhor trabalho foi feito quando o Chelsea teve a ousadia de assumir a liderança. Assim que o La Real recuperou a posse de bola, bateu nas laterais e Vinícius e Rodrygo atearam fogo. Eles eram bem espetaculares. Os números de James contavam uma história miserável: apenas um tackle, três vitórias para sete derrotas, mais de 20% dos passes errados.
Era uma perseguição à moda antiga.
Bobby Campbell, técnico do Chelsea entre 1988 e 1991, disse uma vez que seus dois zagueiros favoritos eram Glenn Roeder, antiquado e bastante lento, principalmente do Newcastle United, e Lawrie Madden, que jogou pelo Sheffield Wednesday sob o comando de Howard Wilkinson. Porque? “Nunca vi nenhum deles sendo perseguido”, disse ele. “Houve jogos em que o centroavante levou a melhor, porque eles não eram rápidos. Mas eles eram espertos demais para persegui-los.” James tem uma perseguição em Madrid.
E os brasileiros terão visto mais uma prova do que seu time pode ser com Ancelotti no comando. Este é um dos grandes treinadores. Um homem modesto e despretensioso, erroneamente acreditado para sobreviver com pouco mais do que uma sobrancelha esquerda levantada. No entanto, em apenas um jogo, seus alas derrotaram os laterais do Chelsea. Chilwell não aparecerá em Stamford Bridge e Cucurella já foi exposto; James não seria humano se não sentisse medo ao reencontrar Vinicius na terça-feira.
Quanto a Ancelotti, há chance de mais um ano no Real, mas ele está chegando ao fim de sua segunda temporada, e mesmo os treinadores de sucesso no Bernabéu raramente conseguem muitos mais. Se o Brasil ligar, o equivalente a um francês ser convocado para treinar os All Blacks, poucos mereceriam mais elogios.
Postado originalmente como Martín Samuel: Por que Carlo Ancelotti se encaixaria perfeitamente como o primeiro técnico estrangeiro em tempo integral do Brasil?