Ataque à Adnet por canal oficial do governo é mais um julgamento de ditadura – Leonardo Sakamoto

Marcelo Adnet foi alvo da Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República e do Secretário Especial de Cultura, Mario Frías, após veicular uma paródia em um vídeo de uma campanha do governo federal sobre os “heróis brasileiros”. Frías, que estrela o vídeo, chamou o comediante “rastejar”, “criatura imunda” e “tolo”. A publicação de uma foto da Adnet pela Secom, na qual afirma que “despreza os brasileiros” em suas redes sociais oficiais, provocou uma onda de ataques bolsonaristas contra ele.

O caso é mais uma triste evidência de que a secretaria tem atuado como corpo de propaganda política, mas também de repressão contra os críticos do governo. Assim, reproduz modelos adotados por ditaduras de direita e esquerda em todo o mundo.

E lembre-se das piores práticas de nossos próprios períodos autoritários. Não só as da última ditadura militar (1964-1985), a exemplo do Presidente da República, mas também as do ex-Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) da ditadura de Getúlio Vargas (1937-1945).

O DIP funcionou como instrumento de promoção pessoal de Vargas, de sua família e das principais autoridades de seu governo. Ao mesmo tempo, atuou na coerção da crítica e da liberdade de expressão, no combate a qualquer ideia que o Estado Novo considerasse perturbadora da unidade nacional e na censura das artes e do jornalismo.

Para defender os interesses pessoais do presidente e de seus assistentes, o Secom foi acusado de perseguição política. E ferir a impessoalidade e probidade da administração pública ao usar uma conta oficial do governo para atacar cidadãos por expressarem opiniões contrárias às do presidente.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que vai processar o Ministério Público Federal e pedir ao Congresso Nacional que apure a ação da agência. Espero que o novo melhor amigo do Bolsonaro, o centão, permita.

Marcelo Adnet, infelizmente, não foi o primeiro, nem deve ser o último

Em 3 de fevereiro, por exemplo, a secretária usou sua conta no Twitter atacar a cineasta Petra Costa, diretora do documentário “Democracia em Vertigem”. A obra narra a trajetória dos governos do PT, passando pelo impeachment de Dilma Rousseff à atual crise política. Petra, uma das finalistas do Oscar, criticou o governo Bolsonaro na televisão pública dos Estados Unidos.

“Nos Estados Unidos, a cineasta Petra Costa assumiu o papel de ativista anti-Brasil e difama a imagem do país no exterior. Mas estamos aqui para mostrar a realidade. Não acredite na ficção, acredite nos fatos”, publicou a Secom . Isso gerou ameaças contra ele de grupos de torcedores do presidente.

Secom também é usado para atacar a própria democracia

Como post, em 10 de março deste ano, no qual reforçou a “legitimidade” de uma manifestação bolsonarista que ocorreria cinco dias depois. “As manifestações de 15 de março não são contra o Congresso ou o Judiciário. São a favor do Brasil”, disse em nota em que transcreveu a sentença de Bolsonaro.

No dia 15 de março, a “legítima manifestação” pediu o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal. Em frente ao Palácio do Planalto, os participantes gritavam “AI-5! AI-5! AI-5! AI-5!”, Enquanto Bolsonaro os cumprimentava. Promulgada pela ditadura militar, em dezembro de 1968, a Lei Institucional nº 5 autorizou o presidente a encerrar o Congresso, estabelecer a censura e baixar o bastão geral.

E a mídia social do governo tem sido usada para colocar em risco a saúde das pessoas.

Esta semana, depois que Bolsonaro argumentou que “ninguém pode forçar ninguém a se vacinar” contra coronavírus, acendendo a parte ultraconservadora de seus seguidores, a Secretaria de Comunicação Social reforçou a mensagem. Ele usou um canal institucional para dizer que ninguém será forçado a tomar nada.

Em outras palavras, ele usou recursos públicos em uma plataforma pública para promover a posição ideológica do presidente. Pior ainda, cometer um crime contra a saúde pública. Diante das repercussões negativas, a Secom republicou. Ele disse que “o Brasil é uma democracia, o governo é liberal e seu presidente não é um tirano”.

A secretaria sabe que, no que diz respeito à vacinação obrigatória, isso não significa picar cidadãos à força, como se fazia há mais de cem anos. Mas restringindo o acesso a certos direitos, por exemplo. O próprio Ministério da Cidadania afirma que manter a vacinação infantil em dia é condição para continuar recebendo a sacola.

Você sabe, mas ajuste as metas republicanas às necessidades de Bolsonaro. Assim, sua função tem ido muito além de fornecer informações para garantir a qualidade de vida da população. Tornou-se um serviço de propaganda no interesse de seu líder. E o público se torna privado.

Recursos públicos para defender o presidente e seus assistentes

O DIP ajudou no culto à personalidade de Getúlio Vargas e na construção da ideia de “pai dos pobres”. O Secom é visto como uma das ferramentas do atual presidente para atingir o mesmo objetivo, reescrevendo a história se necessário. A difusão massiva de ajuda de emergência, ignorando a paternidade de deputados e senadores, por assim dizer.

“O que convence as massas não são os fatos, mesmo que sejam inventados, mas apenas a coerência com o sistema do qual esses fatos fazem parte”, diz a filósofa Hanna Arendt, no clássico “Origens do totalitarismo”. “A propaganda totalitária cria um mundo ficcional capaz de competir com o mundo real, cuja principal desvantagem é não ser lógico, coerente e organizado”, afirma.

Os fanáticos partidários de Bolsonaro acreditam na infalibilidade de seu líder, embora ele não tenha reconhecido que errou ao tratar uma pandemia que já matou mais de 126 mil pessoas no Brasil como “fantasia”, “histeria”, “fluzinha”, “calafrios” . A presunção de infalibilidade não se baseia na inteligência superior, mas, segundo Hanna Arendt, na crença de que atua como tradutora de forças históricas e naturais. Para construir essa narrativa, nada como as redes sociais a serviço do presidente, com dinheiro público.

O bolonarismo tem um componente revolucionário, subvertendo as instituições e falando diretamente à sua massa. Ele tomaria de assalto a democracia se pudesse, colocando algo feio em seu lugar. Apesar disso, não o comparo ao nazismo e outros movimentos totalitários. Mas há uma analogia com suas práticas publicitárias, menos por desejo do analista do que por causa do comportamento de Bolsonaro.

Em suma, as instituições não funcionam normalmente. A menos que o “normal” seja a escravidão da Colônia e do Império, a perseguição e censura ao Estado Novo e o pequeno caso com a vida e a liberdade da ditadura militar.

Na hora certa: todo esse barulho não deveria ser uma “chuva de ouro”, ou seja, uma distração de outras coisas que importam. Como a resposta não foi dada à pergunta: Presidente, por que Michelle Bolsonaro recebeu R $ 89 mil de Queiroz e sua esposa?

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