LISBOA – A professora paulista Carol Belei Vidigal não planejava entrar no avião tão cedo. Ela e o marido viveram uma saga de seis voos em três dias de Chipre a Guarulhos no início do surto do coronavírus em março. Mas em outubro volta à Europa para fazer um mestrado em educação em Braga. É uma das histórias que ilustram os números obtidos pelo GLOBO: os pedidos de visto de novos estudantes brasileiros para Portugal durante a pandemia aumentaram 18% em relação ao último ano letivo (2019/2020).
A queda recorde de 16,5% do Produto Interno Bruto, o desemprego que dizimou 180 mil vagas em quatro meses, a desvalorização do real frente ao euro e a dificuldade de alugar um imóvel não assustam os novos emigrantes, que embarcam com esperança em jejum Recuperação econômica e da saúde. Diante do caos nos vizinhos europeus, Portugal pode ser considerado eficiente na luta contra o coronavírus. Mesmo com a pandemia em curso, o país faz de suas universidades uma porta de entrada para estrangeiros.
– O visto de estudante sai mais rápido que os demais, até um mês. Voltei em março, mas já estou indo para a Europa de novo, porque o Brasil, nesse caos, não pode ir. Em Portugal, as coisas já estão bem melhores, hospitais sem tantos casos de Covid-19, comércio aberto e aulas voltando ao normal – disse Carol.
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A paulista de 27 anos matriculou-se na Universidade do Minho (UMinho), alugou um apartamento em Braga e pretende modificar o mestrado de dois anos com o doutorado para duplicar a estadia em Portugal:
– Fiz um intercâmbio na Irlanda, trabalhei em um hotel no Chipre e visitei 22 países europeus. Sei que há uma crise, mas a Europa tem mais potencial para superar. Mesmo na pandemia, era fácil passar no mestrado, apenas com a análise do título. Vou cursar Educação Especial em Intervenção Precoce, que não está disponível no Brasil. Não pretendo voltar.
Bruna Costa Santos, da Bahia da Vitória da Conquista, mora em São Caetano (SP). Aos 27 anos, tem um emprego estável na área de comunicação interna de uma seguradora. Ela também é professora de ioga e dá aulas online. Foi admitida no Mestrado em Comunicação, Arte e Cultura da UMinho, que recebe inúmeros pedidos de informação e solicitações do Brasil, mas informou que ainda não dispõe dos dados recolhidos.
– Recebi meu visto em casa no dia 10 de agosto, exatamente um mês após o envio do pedido. Há dois anos planejava fazer um mestrado. E bem nesse momento (pandemia) me inscrevi e resolvi ir – disse Bruna.
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Pesquisas sobre evolução e controle do coronavírus (53 mil casos) e custo de vida no país embasaram a decisão da professora de ioga, que continuará com aulas online e trabalho remoto para a seguradora até dezembro. Como a maioria dos novos emigrantes, Bruna vê a eficiência do Sistema Único de Saúde no combate a uma possível segunda onda da pandemia na Europa como mais um motivo para deixar o Brasil.
– Portugal tinha uma política eficaz de combate ao Covid-19, e os óbitos não chegaram a 2.000, muito diferente dos nossos 100.000. Eu entendo que a população do Brasil é muito mais velha, mas as medidas preventivas que tomaram desde o início garantiram os números baixos. Na verdade, a UMinho desenvolveu uma máscara que mata o vírus, declarou.
83,3% dos estudantes brasileiros eram
Os números ainda são apurados pelo Ministério da Ciência e Ensino Superior, pois o período letivo 2020/2021 começa novamente no final de setembro e as inscrições estão em andamento. Mas o secretário de Estado da carteira, João Sobrinho Teixeira, disse que os pedidos de visto têm crescido.
– Os pedidos de visto de estudante (brasileiro) até junho ultrapassaram em aproximadamente 18% o número de pedidos de visto do ano letivo anterior – Teixeira garantiu.
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O Brasil representa cerca de 40% dos alunos estrangeiros matriculados em Portugal. No final do ano letivo, em julho, eram 25 mil (dados provisórios), um acréscimo de 19% face a 2018/2019.
A Associação Nacional de Estudantes e Pesquisadores Brasileiros em Portugal (ANEPBP) realizou uma pesquisa em junho e constatou que 83,3% dos estudantes brasileiros permaneceram em Portugal durante a pandemia. O estudo “Intercâmbios de estudantes em tempos de crise”, do programa Erasmus, revelou que 51% dos quase 60 mil estudantes estrangeiros em Portugal permaneceram no país. Durante a pandemia, 8.320 brasileiros recorreram aos voos de repatriação do Itamaraty: a maioria turistas.
– Se quisermos colocar isso em termos de superação de metas, podemos igualar que são 25 mil e queremos chegar a 30 mil (alunos do Brasil). Há uma evolução desconhecida da pandemia, mas temos uma estratégia em vigor, com aulas presenciais e, ao mesmo tempo, à distância – explicou Teixeira.
A Universidade do Porto (com mais de 2.000 brasileiros) informou que o número de candidatos é “ligeiramente superior ao do ano passado”. A instituição chegou mesmo a transmitir ao Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) de Portugal uma preocupação dos alunos sobre possíveis atrasos na emissão de vistos. O MNE, que recebeu 48.000 pedidos de visto desde março, garantiu que não há atrasos no processamento.
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Na FCT Nova, em Lisboa, com cerca de 300 brasileiros, as candidaturas mantiveram-se ao nível do último ano letivo.
– Trabalhamos com escolas de referência no Brasil e, infelizmente, esta explosão (de casos) no Brasil pode contribuir para a vinda de alunos para Portugal. Garantimos às famílias que estamos preparados e que os alunos têm prioridade na concessão de vistos. Caso seja necessário um novo bloqueio, teremos videoaulas. No campus é proibida a circulação sem máscara e as salas serão limitadas a 1/3 da ocupação, explicou Ricardo Jardim Gonçalves, vice-diretor de Internacionalização da Nova.
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A universidade concede uma bolsa de mérito com 50% de desconto aos alunos que não reprovam. Mas, em geral, os alunos estrangeiros não se beneficiam de bolsas. Durante a pandemia, estudantes que lutavam para pagar as mensalidades protestaram. A ANEPBP enviou carta às reitorias a exigir uma solução, tal como fez a Associação Académica da Universidade de Lisboa. Os valores podem variar de € 3.000 (R $ 19.000) a € 12.000 (R $ 76.000) por ano. Muitos alunos são sustentados por receitas do Brasil.
Mais de 20.000 residentes renovaram vistos em um mês
De 21 de julho, data do lançamento da plataforma do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) para renovação automática do visto de residência na Internet, até 10 de agosto, mais de 20 mil brasileiros que já residem em Portugal tiveram os seus processos. permanência legal atualizada. Esse número representa metade das mais de 40 mil solicitações feitas por estrangeiros residentes no país.
A mineradora Patrícia Cardoso entrou no processo um dia após a estreia do site e levou o documento no dia 11 de agosto. Entre idas e vindas vive em Portugal desde 2009 e não pensa em voltar para o Brasil.
– A última vez que estive no Brasil por dez meses e não estou mais acostumada. Aqui em Portugal tens emprego, só falta querer. Mesmo quem não ganha muito tem uma boa qualidade de vida – disse ela, que tem 45 anos, mora no Estoril, nos arredores de Lisboa, trabalha numa empresa de limpeza e também como babá: – Este pós-quarentena surpreendeu-me porque tem emprego .
Rafael Andrade também é mineiro e mora na periferia de Lisboa. Trabalha na construção civil e renova a autorização de residência a cada dois anos. Desta vez, eles concederam três anos de permanência.
– Minha vida é aqui, não vou voltar para o Brasil. Mas no futuro, não sei. Se você tem emprego, pode viver em boas condições aqui – disse.
Em julho, foram criadas 2,9 mil empresas em Portugal, menos 26% do que no mesmo período de 2019, segundo a Informa D&B. Um pequeno sinal de recuperação em relação às 6.900 empresas fechadas de janeiro a julho. Dono da Casa do Sono em Lisboa, que vende colchões, o brasileiro Leon Netto expandiu-se para o Porto, deu início ao processo de negociação das franquias da marca e vai ainda contratar brasileiros no Brasil.
– A partir de setembro, vamos contratar fornecedores brasileiros que gostariam de trabalhar em Portugal quando a suspensão do visto de trabalho for revogada. Oferecemos um salário fixo, comissões e um contrato para a pessoa a ser legalizada. Nosso projeto é abrir cinco lojas por ano e, consequentemente, mais empregos – disse Netto.