O desmatamento em territórios indígenas causou a emissão de 90 milhões de toneladas métricas de CO2 em 2013-21 – Eurasia Review

O desmatamento em Terras Indígenas (TI) na Amazônia brasileira provocou a emissão de 96 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) entre 2013 e 2021, modificando o papel da floresta como sumidouro de carbono nessas áreas. As emissões nos últimos três anos do período (2019-21) representaram 59%, refletindo a intensificação da destruição.

Os dados são de uma pesquisa liderada por brasileiros e publicada em artigo na relatórios científicos. Os autores mostram que o desmatamento na TI totalizou 1.708 quilômetros quadrados (km²), ou 2,38% do desmatamento total na Amazônia brasileira no período. Em uma análise de 232 TIs, eles descobriram que o desmatamento anual foi de 35 km², aumentando 129% entre 2013 e 2021. O aumento foi de 195% nos últimos três anos do período.

De forma alarmante, o artigo também mostra que a distância das áreas desmatadas aos limites das TIs em questão aumentou significativamente no período, aumentando em 30%, passando de 6,80 km para 8,87 km em média.

“Em números absolutos, as áreas desmatadas nessas TIs podem não parecer tão grandes, mas as TIs deveriam ser ambientalmente protegidas, então o impacto é ainda maior. Além da destruição da natureza, o desmatamento traz consigo outros problemas, como doenças e ameaças à sobrevivência de comunidades indígenas isoladas. Um caso recente envolveu os Yanomami, muitos dos quais morreram devido à invasão de garimpeiros selvagens. [garimpeiros]”, disse Celso HL Silva-Junior, primeiro autor do artigo, à Agência FAPESP. É professor do Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade e Conservação da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Considerado um modelo eficiente de conservação florestal, o TI tem sofrido crescente pressão da extração ilegal de madeira aluvial e das operações de mineração. O aumento do desmatamento, em parte impulsionado por contratempos como a reversão da política governamental sobre os direitos das comunidades indígenas, põe em risco o papel crucial da Amazônia como armazenamento de carbono. As florestas tropicais são ecossistemas essenciais para mitigar os efeitos adversos das mudanças climáticas, pois atuam como sumidouros de carbono, desde que não sejam afetadas. No entanto, o desmatamento extensivo, a queima e a extração de madeira podem transformar as áreas em questão em fontes significativas de emissões de carbono. Daí a importância da TI para promover a conservação e combater o desmatamento.

“Devemos levar em consideração que a TI é essencial para que o Brasil cumpra seus objetivos ambientais e mitigue os impactos das mudanças climáticas. A conservação das florestas e dos rios nessas áreas é essencial. A lei deve ser cumprida para que continuem atuando como um campo de força para proteger a floresta em pé e as comunidades tradicionais que nela vivem”, disse Guilherme Mataveli, coautor do artigo. Mataveli é pesquisador da Divisão de Observação da Terra e Geoinformática (DIOTG) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) no Brasil e tem bolsa de pós-doutorado da FAPESP.

O estudo também recebeu financiamento do Centro de Pesquisa em Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI), Centro de Pesquisa em Engenharia (ERC) criado pela FAPESP e Shell na Universidade de São Paulo (USP), e por meio de um Projeto Temático vinculado ao Programa de Pesquisa da FAPESP sobre Mudanças Climáticas Globais (RPGCC).

Em artigo publicado no ano passado na Ciência, Mataveli já havia alertado que o aumento do desmatamento na TI prejudicava a capacidade do Brasil de cumprir suas metas. O Brasil se comprometeu a restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de floresta até 2030 e alcançar zero emissões líquidas de carbono até 2050, como parte de suas metas de contribuição determinadas nacionalmente no Acordo de Paris de 2015.

Um terceiro estudo de cientistas do mesmo grupo destacou a expansão da mineração selvagem de TI na Amazônia Legal, uma área que abrange nove estados brasileiros definidos por lei federal para fins de desenvolvimento e proteção ambiental. Toda mineração nessas áreas é ilegal. No período 1985-2020 aumentou 1.217% de 7,45 km² para 102,16 km². A grande maioria (95%) ocorreu nas TIs Kayapó, Munduruku e Yanomami, nos estados do Pará e Roraima.

Concentração

No último estudo, o desmatamento aumentou em 42% dos TIs analisados, significativamente em 20, de Arara no Pará com taxa de 0,02 km² ao ano até Apyterewa, também no Pará, com 8,58 km² ao ano.

Por outro lado, o desmatamento diminuiu em 11% dos TIs analisados, significativamente em cinco. Entre eles, o Alto Turiaçu (MA), onde vivem cerca de 1.500 membros das comunidades Awa Guajá, Ka’apor e Tembé.

“O foco do artigo eram as ameaças aos Territórios Indígenas, mas esse declínio foi uma descoberta interessante. No caso do Maranhão, por exemplo, as comunidades indígenas conseguiram esse resultado positivo porque têm iniciativas próprias para combater o desmatamento, como grupos que patrulham a área como guardiões da floresta”, disse Silva-Junior.

Ele destacou que a equipe de pesquisadores era multidisciplinar, com dois antropólogos que contribuíram com diferentes ângulos sobre o assunto: Maycon Melo, do Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente da Universidade CEUMA (Maranhão), e Bárbara Maisonnave Arisi, da Free University of Amsterdam. (VUA, Holanda).

recomendações

O artigo termina com seis recomendações de políticas públicas para conter o desmatamento nessas áreas: fortalecer as autoridades de fiscalização; revogar leis e medidas que tenham causado degradação ambiental; criar uma zona tampão de 10 km entre TI e áreas de mineração ou projetos de alto impacto; apoiar iniciativas sustentáveis ​​de uso da terra, incluindo restauração de ecossistemas; mais investimento em monitoramento por sensoriamento remoto, incluindo novos sistemas com frequência e escala melhoradas; cancelar todos os Cadastros Ambientais Rurais (CAR) das TIs; e fortalecer a FUNAI, órgão federal responsável pela garantia dos direitos das comunidades indígenas, com mais recursos e pessoal.

Neste ano, a advogada Joenia Wapichana se tornou a primeira indígena a ser indicada para chefiar a Funai.

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