‘A alegria das coisas’, de Thais Fujinaga, revela o lado oculto da felicidade

Still de ‘A Alegria das Coisas’ de Thais Fujinaga

Por Fernanda Franco
24 de junho de 2023

No auge do verão no hemisfério norte, Fernanda Franco relembrou a história das férias de praia de uma família brasileira.

Thais Fujinaga a alegria das coisas (PARA Felicidadecoisas, 2021) reflete sobre o que poderiam ter sido as férias dos sonhos de uma família de paulistanos de classe média (moradores de São Paulo): uma viagem pelo litoral. Caraguatatuba tem sido um destino popular para aqueles que podem se dar ao luxo de escapar da mega selva de concreto de São Paulo. O primeiro longa-metragem de Fujinaga é inspirado nas memórias queridas de sua infância. Ele visitava a pequena cidade litorânea com a família durante as férias escolares.

O filme segue Paula (Patrícia Saravy), uma mulher grávida de 40 anos que passa o tempo entre uma praia pouco atraente e uma casa de veraneio recém-adquirida. Junto com sua mãe amorosa Antonia (Magali Biff) e seus dois filhos, os pré-adolescentes Gustavo (Messias Gois) e Gabriela (Lavinia Castelari), a futura mamãe planeja construir uma piscina para a família.

Fujinaga abre o filme com uma visão tranquila das ondas do mar quebrando na praia onde a família estava tomando banho de sol. Uma cena silenciosa que é repentinamente interrompida por uma van passando por eles criando suspense e intriga. Mais tarde, na casa, um contêiner de fibra de vidro azul fica ao lado de um grande buraco cavado no jardim da frente. O modesto local de férias fica na margem de um rio com vista para uma enorme ponte que leva a um clube de lazer do lado oposto. Os sonhos de Paula de ter uma piscina estão desmoronando. Seu marido ausente, nunca visto ou ouvido na tela, parece estar ocupado trabalhando na capital, incapaz de encontrar sua família. Uma sequência de telefonemas e mensagens não atendidas sugere que Paula está à beira de uma crise conjugal agravada pela dificuldade financeira. Todas as suas frustrações começam a vir à tona, afastando-a de seus planos e de sua família.

Paula avisa os filhos para não se aproximarem do rio, mas curiosamente eles observe os adolescentes locais nadando na água escura. Os invasores sentam-se à beira do rio, onde um pescador local continua voltando para pescar. Paula fica chateada com a invasão. Sua ansiedade aumenta quando o dono de uma loja pede que ele devolva a piscina por falta de pagamento. Recusando-se a pagar por uma assinatura do clube para as crianças aproveitarem o resto das férias, ele insiste que sua piscina seja construída. Para completar, uma chuva torrencial impede as crianças de brincar lá fora. Paula se sente sobrecarregada com a responsabilidade de ter que lidar com tudo sozinha. Mascarada por um marido ausente, ela lida com todos os conflitos à sua maneira e não sabe que a família está de férias e deve estar se divertindo, apesar de uma série de infortúnios. Ter a piscina instalada torna-se uma prioridade obsessiva que reflete a forma como ela reage aos que a rodeiam. Paula mantém sua mente ocupada com um assunto tão periférico na tentativa de esconder seus verdadeiros sentimentos. A fixação por coisas materiais e a construção do pool dos sonhos contra todas as adversidades vai além de valores e relações humanas.

A água neste filme é usada para refletir desejos, sonhos e segredos humanos, provocando suspense e medo, principalmente quando o rebelde Gustavo é forçado a nadar no rio proibido no meio da noite após uma perigosa pegadinha na boate. Fujinaga reflete sobre um relato da vida cotidiana que resume a vida comum. Sua abordagem subjetiva de assuntos mundanos sugere que a felicidade pode ser encontrada em coisas triviais. Seu filme sutil é multifacetado e flerta com a luta feminina em uma sociedade patriarcal, a maternidade e as responsabilidades familiares socioeconômicas. Clareza e realismo no estilo cinematográfico afastam a câmera do espectador. O gênero narrativo parece mudar do drama familiar para a maioridade, à medida que a jornada de Gustavo assume a liderança no final.

a alegria das coisas foi feito durante um período sombrio para a cultura no último governo de extrema direita no Brasil. Em 2016, o projeto havia garantido financiamento por meio do PRODECINE 5, braço do órgão federal de fomento (ANCINE) que foi totalmente congelado em 2019, quando Bolsonaro assumiu a liderança do país. Ironicamente, o audiovisual brasileiro havia atingido a marca de 185 produções em 2018, o maior número de produções desde ‘Retomada’ na década de 1990, atingindo uma audiência nacional de 24 milhões. A produção do filme começou em 2019, pela Filmes de Plástico, produtora independente de Belo Horizonte (Minas Gerais). Filmes o Plástico tem fama de abordagem realista dos projetos e rejeita a artificialidade comumente encontrada no cinema mainstream. Em 2021, o filme teve estreia virtual na seção Bright Future do Festival Internacional de Cinema de Rotterdam e também ganhou o prêmio de Melhor Filme de um Novo Diretor na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Finalmente chegou aos cinemas em 2022.

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