Personagem fundador da literatura modernista brasileira, Macunaíma foi pintado como um herói do povo. Segundo a história homônima, Macunaíma era um indígena nascido na Amazônia que viajou a São Paulo para recuperar um amuleto. Escrito por Mário de Andrade, o livro tornou-se amado como uma representação da diversidade do país em uma época em que as histórias indígenas eram sub-representadas na cultura brasileira em geral. Agora 86 anos depois macunaíma foi publicado pela primeira vez, o personagem ganhou relevância renovada, desta vez nos balcões dos bares do Brasil.
O ano era 2014 e o país estava prestes a sediar a Copa do Mundo, uma obsessão do Brasil, cuja seleção conquistou o primeiro lugar nas oitavas de final. “Na época, eu estava me esforçando para criar um novo coquetel que incorporasse esse espírito”, lembra Arnaldo Hirai, bartender e sócio do Boca de Ouro, em São Paulo, um dos bares populares da cidade. Ele lembra de ter encontrado pouquíssimas receitas feitas com cachaça.
Misturando a aguardente nativa com Fernet-Branca, limão e açúcar, Hirai criou uma receita que rapidamente se espalhou pelo país; foi um clássico instantâneo. Como ele tirou a bebida tão rápido? “Acho que tem a ver com sua simplicidade”, diz ele. “Quase todo bar tem cachaça, limão e uma garrafa empoeirada de Fernet na prateleira.” Hirai nomeou o coquetel em homenagem a um instrumento de percussão brasileiro, o caxirolamas percebeu que “Macunaíma” representava melhor a cultura brasileira que tentava canalizar.
Ainda mais fácil do que a lista de ingredientes é a preparação. Como Hirai acredita que o coquetel cítrico é leve o suficiente por si só, ele não sugere servi-lo com gelo para diluí-lo ainda mais. Em vez disso, ela recomenda mexer para espumar os cítricos antes de coar a bebida em um copo gelado e sem gelo. Embora o método seja simples, Hirai diz que há um elemento crucial a ser considerado: use uma boa cachaça envelhecida em bálsamo, uma madeira brasileira amplamente utilizada que confere aromas de cravo e anis. “A cachaça envelhecida em bálsamo confere certa adstringência”, diz Jean Ponce, fundador do premiado bar paulistano Guarita, “e a mistura com Fernet equilibra a acidez e a doçura, contrastando com o limão e o açúcar. É uma combinação perfeita.”
Eventualmente, o Macunaíma ultrapassou as fronteiras de São Paulo, cidade com uma cena de coquetelaria mais consolidada, para se tornar um sucesso em todo o país. Vários bares decidiram replicar a receita de Hirai e torná-la sua. No Lamparina, bar temático de cachaça em Belo Horizonte, por exemplo, uma cachaça produzida em Minas Gerais forma a base do shot, localizando ainda mais a bebida.
Também em sua cidade natal, São Paulo, a bebida aparece em muitos cardápios. E, embora não tenha nem uma década, já é considerado um clássico. Por exemplo, ele Macunaíma está na lista do Escarcéu, bar paulistano que homenageia barcos (bares simples) e a cultura boêmia brasileira. “Tentamos voltar no tempo aos anos 1970, quando os bares ainda não passavam por uma certa gentrificação, e resgatar uma essência brasileira original”, diz Edu Passarelli, um dos fundadores do conceito descontraído. E embora seja uma parte bem mais recente da história da coquetelaria, “Macunaíma representa essa simplicidade, então não poderíamos deixar de fora da nossa lista”.