SÃO PAULO — À beira da selva amazônica brasileira, a família Rovaris é símbolo de uma história de pioneirismo e sucesso.
A família chegou ao estado de Mato Grosso na década de 1970 como parte de uma onda de expansão agrícola impulsionada pela então ditadura militar do país. Em um curto espaço de tempo, o clã Rovaris acumulou grande riqueza enquanto os agrônomos descobriam como cultivar soja com sucesso no clima tropical severo.
Agora, o herdeiro da família, Atilio Rovaris, está sob investigação na extensa investigação criminal sobre como apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro tentaram subverter a democracia brasileira quando bloquearam estradas logo após o escolha e assumiu temporariamente vários prédios do governo na capital Brasília no início de janeiro. Bolsonaro perdeu a eleição de outubro para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um resultado que muitos apoiadores de Bolsonaro não aceitam.
Grande parte da investigação se concentra no trecho norte da rodovia BR-163, construída na década de 1970. Ela conecta duas das bases de apoio mais importantes de Bolsonaro. No Mato Grosso, são Rovaris e outros empresários de cidades ricas como Sorriso, maior produtor de soja do Brasil. No Pará, são grileiros, garimpeiros ilegais e madeireiros que sustentam cidades empobrecidas como Novo Progresso, 700 quilômetros ao norte de Sorriso.
Dias depois da fracassada aquisição, o ministro da Justiça, Flávio Dino, disse que os “setores agroindustriais” estavam entre os principais financiadores. E a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse que alguns dos manifestantes estavam ligados a atividades criminosas na Amazônia.
“Uma parte significativa da multidão enfurecida eram pessoas que, sob o governo Bolsonaro, acreditavam que suas atividades criminosas, como desmatamento, grilagem de terras, extração ilegal de madeira, pesca ilegal e mineração ilegal, ficariam impunes”, disse ele. Folha de S. Paulo alguns dias depois do atentado de 8 de janeiro.
Bolsonaro venceu por ampla margem nos centros populacionais ao longo da rodovia, já que muitas pessoas nessas áreas compartilham sua visão de que o Brasil precisa impulsionar o crescimento econômico revertendo as regulamentações ambientais destinadas a conter o desmatamento. Eles veem as unidades de conservação e os territórios indígenas como barreiras que prejudicam o agronegócio. As áreas protegidas da região sofrem invasões de fazendeiros, madeireiros e garimpeiros.
O fato de tanto apoio a Bolsonaro vir dessas áreas pode complicar a promessa de Lula de alcançar o “desmatamento zero” na Amazônia, já que tais esforços exigirão a adesão dos habitantes locais e devem ser combinados com formas sustentáveis de desenvolvimento.
Rovaris, piloto amador de rali, não esconde seu apoio a Bolsonaro. Foi um dos maiores doadores de sua campanha presidencial, contribuindo com quase US$ 100.000, segundo dados eleitorais públicos.
Embora nenhuma evidência tenha surgido na investigação incipiente que o liga publicamente aos manifestantes que vandalizaram o palácio presidencial e o Congresso do Brasil, ele está sob investigação por suposto apoio a protestos que bloquearam as principais rodovias por semanas em uma tentativa de restaurar Bolsonaro no poder depois de perder o mandato eleições. em outubro.
Em novembro, uma conta bancária pertencente a uma empresa de transporte de propriedade de Rovaris foi uma das 43 bloqueadas pelo Supremo Tribunal Federal como parte de uma investigação sobre possíveis crimes contra a democracia brasileira. Ao todo, 30 das contas congeladas pertenciam a indivíduos ou empresas de Mato Grosso, um sinal de quão profundo o apoio a Bolsonaro continua em um dos principais centros econômicos do Brasil.
“Existe um reiterado abuso do direito de reunião, direcionado de forma ilegal e criminosa, para propagar o descumprimento e o desrespeito ao resultado da eleição presidencial”, escreveu o desembargador Alexandre de Moraes na decisão.
Rovaris simplesmente apoiou Bolsonaro na campanha e não se envolveu em atos antidemocráticos, disse Larissa Gribler, sua porta-voz, à Associated Press. Gribler disse que Rovaris se recusou a responder a mais perguntas ou dar uma entrevista.
Durante seu primeiro mandato como presidente, entre 2003 e 2006, Lula iniciou a pavimentação da BR-163, obra posteriormente concluída por Bolsonaro. Como parte da licença ambiental para autorizar a pavimentação, foram criadas unidades de conservação ao longo da rodovia. O objetivo era “fechar a fronteira agrícola” para evitar o desmatamento descontrolado, como havia ocorrido em Mato Grosso.
Na região de Novo Progresso, no estado do Pará, essas unidades de conservação têm sido amplamente invadidas por grileiros, que lutam para cancelá-las. O exemplo mais proeminente é a Floresta Nacional do Jamanxin, a unidade de conservação federal mais desmatada da Amazônia.
Um bloqueio de estrada durou vários dias em novembro. A filmagem mostra carros de polícia sendo apedrejados por uma multidão enfurecida e uma castanheira, uma espécie protegida, derrubada na estrada. De acordo com a imprensa local, cerca de 30 moradores de Novo Progresso foram detidos em Brasília após o ataque. Entre eles estava o dono de uma serraria.
“A cidade depende de atividades ilegais como garimpo ilegal de ouro, extração ilegal de madeira, criação de gado em áreas proibidas dentro de unidades de conservação e grilagem de terras”, disse Mauricio Torres, geógrafo da Universidade Federal do Pará. .
“Bolsonaro apoiou essas atividades ilegais. E as pessoas estão dispostas a matar e morrer por isso porque não têm outra escolha. Então não sei como Lula vai conseguir implementar o estado de direito”, acrescentou.
Essa é uma situação diferente de Sorriso, onde o desmatamento inicial e a grilagem de terras foram legalizados décadas atrás, e a economia depende da exportação de soja, disse Torres.
Assim como o perfil dos redutos de Bolsonaro na Amazônia é diferente, o combate ao desmatamento exigirá abordagens diferentes, dependendo da localização, segundo especialistas em desmatamento.
O governo Lula terá que atuar em muitas frentes, disse Brenda Brito, do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, grupo focado no desenvolvimento sustentável da Amazônia. Terá que reverter decisões judiciais que favoreceram grileiros dentro de unidades de conservação e oferecer uma ampla gama de incentivos econômicos, desde concessões de terras florestais até apoio ao ecoturismo.
“Caso contrário, mesmo que consigamos eliminar os invasores, as áreas protegidas serão invadidas novamente”, afirmou.
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