Talvez não haja nação mais sinônimo de futebol e Copa do Mundo do que o Brasil, e a nação sul-americana também ama o esporte.
Mas sua famosa camiseta amarela se tornou um ícone divisivo, graças à sua versão de Donald Trump: um presidente de extrema-direita com um mandato, Jair Bolsonaro.
E, por sua vez, criou a situação bizarra em que o país está dilacerado; sim, a maioria ainda ama o time. Mas nem todos. E não sem algumas preocupações.
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Bolsonaro, que fez do Brasil um foco de casos de Covid nos últimos anos e permitiu a devastação generalizada da floresta amazônica em um ritmo assustadoramente acelerado, foi demitido de seu cargo no mês passado.
Mas ao longo de seu reinado, as cores da seleção nacional e da bandeira tornaram-se inextricavelmente ligadas à sua política extrema. De fato, depois que ele perdeu por pouco a eleição para o esquerdista Luiz Inácio Lula da Silva, mais conhecido como Lula, simpatizantes vestindo as cores saíram às ruas e protestaram, muitos pedindo aos militares que derrubassem o governo recém-eleito democraticamente.
Um apoiador de Bolsonaro, que não esteve diretamente envolvido nos protestos, mas foi usado pela campanha para tentar aumentar sua popularidade, se destacou entre os demais: Neymar.
A estrela do PSG surpreendeu a muitos ao falar em apoio ao polêmico então presidente: Lula afirmou, sem provas, que o apoio de Neymar se baseava no fato de Bolsonaro concordar em não perseguir as acusações de evasão fiscal.
De qualquer forma, o apoio de Neymar só agravou o problema; assim como o fato de a Copa do Mundo ter sido disputada ainda este ano, e não em junho e julho, na mesma época da eleição.
“Estamos divididos”, dono de loja de camisetas no Rio de Janeiro, Jorge El Assad disse ao New York Times.
“Muita gente que vem aqui não quer nem a camisa 10 do Neymar, porque apoiou o Bolsonaro. Isso nunca aconteceu. Nunca.”
Neymar havia prometido dedicar seu primeiro gol da Copa do Mundo a Bolsonaro, deixando muitos torcedores que assistiam às partidas do time na fase de grupos consternados, principalmente quando ele perdeu tempo devido a lesão.
Assistir à partida em um bar lotado no centro do Rio de Janeiro, onde torcedores vestidos de amarelo e verde aguardavam nervosos aquele que acabou sendo o único gol contra a Suíça – marcado aos 83 minutos por Casemiro – uma lei de 23 anos. o aluno Henrique Melo explicou seu dilema.
Casemiro leva Brasil às eliminatórias | 01:04
Como fã de futebol, eu queria desesperadamente que Neymar se recuperasse da lesão no tornozelo que o afastou no final da vitória do Brasil por 2 a 0 sobre a Sérvia, na qual a estrela do Paris Saint-Germain brilhou apesar de não ter marcado o gol.
“O time sente falta dele”, disse Melo, vestindo com orgulho a camisa da nação louca por futebol.
Ao mesmo tempo, o fato de o jogador mais caro do mundo ainda não ter marcado no torneio “é o melhor resultado que o Brasil já teve na Copa do Mundo”, brincou.
“Teríamos todos esses apoiadores de Bolsonaro comemorando”, disse Melo, um orgulhoso apoiador de Lula, à AFP.
“Como jogador, Neymar é incrível, é um artista. Como pessoa deixa muito a desejar. Não apenas suas opiniões políticas, mas quem ele é. Em vez de apenas curtir seu estilo de vida luxuoso, ele poderia estar investindo em educação, projetos sociais, dando exemplo para as crianças… Ele poderia ser o cara.”
Na icônica praia de Copacabana, no Rio, onde grandes multidões assistiam ao jogo em um telão gigante, a vendedora Tainara Santana, de 29 anos, sentia o mesmo dilema.
“Gosto de futebol, então quero que (Neymar) jogue porque ele é bom. Mas não posso dizer que estou triste por ele não ter marcado. É muito bom ver Neymar falhar”, riu.
Com sua boa aparência esbelta e muitos seguidores nas redes sociais, Neymar é um dos maiores nomes do esporte.
Mas sua magia no futebol foi manchada às vezes.
Em campo, os críticos acusam a estrela do Paris Saint-Germain, de 30 anos, de mergulhar e não corresponder às expectativas quando necessário. Fora da quadra, ele enfrentou acusações de festa excessiva, fraude fiscal e comportamento malcriado.
“Ele é um idiota”, disse Santana.
“Não só por causa de sua política, mas por causa de seu machismo, seu ego, sua total falta de humildade.”
Neymar vai perder as partidas da Copa do Mundo devido a um problema no tornozelo | 00:30
No fim de semana, “F*** Neymar” virou um dos trending topics do Brasil no Twitter.
A lenda do futebol brasileiro Ronaldo correu em defesa de Neymar. “Você está transando com o Neymar! Gigante!”, escreveu o bicampeão da Copa do Mundo no Instagram.
“Por isso você tem que lidar com tanta inveja e maldade, a ponto de as pessoas comemorarem sua ferida. Quão baixo nós afundamos? ele disse, instando Neymar a “usar esse ódio como combustível”.
Os companheiros Casemiro e Raphinha também defenderam Neymar, dizendo que ele não merecia a sombra que vinha recebendo nas redes sociais.
O Brasil lutou no passado sem Neymar, notavelmente suportando o embaraço da derrota por 7 a 1 para a Alemanha em casa nas semifinais da Copa do Mundo de 2014, depois que seu talismã sofreu uma lesão nas costas.
Em Copacabana, Charleo Luis, partidário de Lula, só queria separar política e futebol.
Os que odeiam Neymar “são idiotas que não entendem nada de futebol”, disse o vendedor ambulante de 24 anos.
“Quem se importa se você apoia Bolsonaro? É um grande jogador. Sou muito fã, adoro. Estou torcendo para que ele se recupere.”
A Copa do Mundo, acrescentou, “é um momento de torcer uns pelos outros como uma grande família”.
Mas os protestos suaves continuaram. A rara camisa azul alternativa do Brasil tem sido uma visão mais popular do que o normal, e estará visível novamente, principalmente em casa, durante a partida das oitavas de final da manhã de terça-feira contra a Coreia do Sul.
Talvez apenas vencer a Copa do Mundo inteira, em amarelo canário, possa iniciar o processo de cura.